quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

"Rosita", Ernst Lubitsch (1923)
 

A popularidade de Lubitsch na Europa chegou a Hollywood, que não hesitou em chamá-lo, em 1923, através de Mary Pickford que lhe pediu para realizar este "Rosita". O êxito foi imediato, o que tornou Lubitsch num dos realizadores mais requisitados do cinema norte-americano.
 
Mas as coisas não foram assim tão simples. Ernst Lubitsch partiu para os Estados Unidos, certo de que iria realizar uma versão de "Fausto" com Lars Hansen no papel-título. Mary Pickford chegou a fazer um teste como Margarida mas a sua mãe proibiu-a de actuar num filme no qual uma jovem mata o seu bébé. Informado de que seria incumbido de outra produção, "Dorothy Vernon of Haddon Hall" (depois filmada por Marshall Neilan), Lubitsch ficou furioso e fingiu não entender bem a história até concordar com Mary em filmar "Rosita", um drama romântico de época, inspirado na peça francesa "Don César" de Bazan. No enredo, Rosita (Mary Pickford), uma cantora das ruas de Sevilha, atrai a atenção do Rei da Espanha (Hoolbrock Blinn), contudo acaba por se apaixonar por Don Diego (George Walsh, irmão do realizador Raoul Walsh), um nobre arruinado.
 
 

Para desenhar os cenários, Lubitsch indicou o cineasta dinamarquês Svend Gade (realizador de "Hamlet" de 1921 com Asta Nielsen), tendo sido a direcção de arte entregue a William Cameron Menzies e os figurinos a Mitchell Leisen. Como Lubitsch não admitia interferências, durante os três meses de filmagens discutiu muito com Mary Pickford e, entre os atritos, o grande fotógrafo Charles Rosher – Oscar por "Sunrise" (1927) de F. W. Murnau -, que havia desenvolvido para "Rosita" uma iluminação de efeitos estereoscópicos, deixou o cargo.
 
O filme classificado por Mary Pickford como “o pior filme que eu já fiz; foi o pior filme que eu ví”. Contudo, por ocasião do seu lançamento "Rosita" foi aclamado como o maior filme feito até então. O The New York Times disse: “Nada de mais deliciosamente encantador … tem sido visto desde certo tempo”.
 
O génio de Lubitsch é percepcionável em quase todos os fotogramas, mas destaque-se este quando Rosita é levada pela primeira vez ao palácio: na sala de espera, ela avista uma taça enorme cheia de doces; enquanto Rosita passa repetidas vezes diante da taça e sai de cena, a câmara fica paralisada na taça.


"Safety Last!", Fred C. Newmeyer e Sam Taylor (1923)


“Safety Last!” é uma das comédias mais engraçadas da história do Cinema e a piada começa no título original, que brinca com a expressão "safety first" (segurança em primeiro lugar). Nos anais da história do Cinema ficará para todo o sempre a impressionante cena de Harold Lloyd pendurado nos ponteiros do relógio de uma arranha-céus nova-iorquino.
 
 

"Safety Last!" é acima de tudo um filme-veículo para a comédia de Lloyd, contando-nos a história de um rapaz do interior que deixa a sua terra Natal para se aventurar na grande cidade. Chegado a Nova Iorque divide um quarto com seu amigo “Limpy” Bill e consegue um emprego de vendedor numa loja; para provar aos seus que tinha alcançado o sucesso imediato, penhora o fonógrafo de Bill, compra um pingente e escreve para a sua namorada que ele é o gerente da loja. A partir daqui reina o caos ... Inesquecível.
 
 
"Os Lobos", Rino Lupo (1923)
 

O Cinema Português ainda nas mãos de realizadores estrangeiros. "Os Lobos" teve a realização do italiano Rino Lupo, no mesmo ano em também realizou "Mulheres da Beira" e que Georges Pallu realizou "Cláudia" e "Lucros Ilícitos", interrompendo assim o plano de adaptações literárias seguido pela Invicta Film, para além do "Primo Basílio", e Roger Lion dirigiu "Os olhos da Alma".
 
"Os Lobos" passa-se na Serra da Cabreira, numa aldeia dominada pela tradição patriarcal: a mulher ocupa-se das lidas do lar ou recolhe lenha; o homem vela pelos rebanhos ou abate árvores de que fará carvão. Após cumprir pena por crime passional, um marítimo chega àquelas paragens, convertendo-se em elemento de fascínio e desagregação da estrutura arcaica.

 

"Mysterien eines Frisiersalons" (a.k.a. The Mysteries of a Hairdresser's Shop), Bertolt Brecht e Erich Engel (1923)


"Mysterien eines Frisiersalons" é uma curta-metragem absurdamente hilariante, com uma história surrealista escrita e realizada pelo dramaturgo Bertolt Brecht e Erich Engel.

Numa barbearia, o famoso Professor Moras, autor do "best-seller" “Como Ser Atraente”, pede ao desajeitado barbeiro para cortar o seu cabelo e barba exactamente igual ao poster exposto numa porta. Entretanto a assistente da barbearia acidentalmente vira o poster ao contrário, expondo a foto de um chinês skinhead com uma barba partida ao meio, pelo que o barbeiro segue exactamente esse estilo. Neste meio tempo, a assistente, que tem uma paixão por Moras, fica com ciúmes da sua acompanhante e maltrata a mulher na cadeira. A mulher grita, e os três clientes que estão a esperar a sua vez ficam apavorados, pois leram na primeira página do jornal que um homem foi cortado na cabeça pelo seu barbeiro.
 
 
O Professor Moras deixa a barbearia completamente irritado com sua estranha aparência e quando ele encontra uma sua conhecida no restaurante, ele coloca o chapéu de um cliente que está pendurado para ocultar a sua careca. O cliente acredita que ele está a roubar o chapéu e desafia-o para um duelo com sabres; todavia, antes da luta, o homem vai à barbearia e o barbeiro assusta-se e acidentalmente decapita-o. O barbeiro prende, então, a cabeça com uma fita, mas durante o duelo, a assistente usa uma cana de pesca para remover a cabeça do homem e salvar o seu amado Moras.
"Der Schatz", Georg Wilhelm Pabst (1923)


"Der Schatz" trata-se do debute cinematográfico de Pabst, feito através das mãos de um dos pioneiros do cinema alemão, Carl Froelich. Pabst realizou "Der Schatz" ainda no estilo do cinema expressionista, quando este estava no seu auge na Alemanha. Os personagens são movidos por pulsões mesquinhas, tão avaros e cobiçosos que se destroem na busca de um suposto tesouro escondido durante as invasões turcas na Áustria em 1683.
 
O sineiro Svetocar Badalic (Albert Steinrück) vive com a mulher Anna (Ilka Grünig), a filha Beate (Lucie Mannheim) e o ajudante Svetelenz (Werner Krauss) numa velha casa no interior do bosque austríaco. Na calada da noite, secretamente, Svetelenz procura desenterrar o tesouro. Com mais sorte, o jovem ferreiro Arno (Hans Brausewetter) chega à casa, apaixona-se por Beate e encontra o tesouro. Sventelenz, Svetocar e Anna tentam descartar Arno para ficarem com todo o tesouro, ao mesmo tempo em que discutem entre si, roídos pela ambição. Cavam literalmente a própria cova, enquanto o jovem casal salva-se fugindo para um novo lar.
 

Na sua atmosfera e na sua unidade de ação, "Der Schatz" revela um realizador influenciado pelo cinema sueco e pela técnica do "Kammerspiel": apenas cinco personagens desenham o conflito mortal. A casa do sineiro aparece atarracada e estufada, como um monte fofo de argila sem fundações, já prestes a seguir o seu destino. E quando o ajudante do sineiro (Werner Krauss) aventura-se na escuridão para apanhar uma varinha mágica capaz de detectar tesouros, galhos saem dos espinheiros como ossos de esqueleto sob o disco brilhante de uma lua de estúdio. Através de sombras projetadas nas paredes, Pabst mostra-nos como o ajudante arrasta-se no chão a farejar ouro de forma animalesca.

Apesar deste primeiro filme expressionista, Pabst acabaria por celebrizar-se pelo “realismo social” dos filmes que realizou durante a República de Weimar, associados ao movimento estético da Nova Objetividade. Ele é geralmente citado como o único exilado que regressou para trabalhar para o Terceiro Reich. Pensava-se, de facto, que Pabst fosse um socialista engajado em políticas “progressistas”, tendo denunciado os horrores da Primeira Guerra; a solidariedade entre mineiros franceses e alemães; o caos do pós-guerra, aonde a miséria e a inflação conduziam os trabalhadores ao desemprego e as mulheres à prostituição.
 
 

Devido a esses engajamentos, confirmados pela divulgação fílmica da psicanálise de Sigmundo Freud e pela adaptação de uma obra de Bertolt Brecht, pensava-se que Pabst havia optado conscientemente pelo exílio em 1933, quando os nazistas tomaram o poder na Alemanha através da acção combinada do terror nas ruas, da propaganda em massa e da democracia representativa despreparada para sua destruição “por dentro”. Contudo, a preocupação social não era alheia ao nacional-socialismo: a denúncia das mazelas da sociedade não bastaria para alinhar ninguém nas fileiras da resistência, não significando uma automática oposição ao nazismo. Dentro do “realismo social” cabiam tanto os artistas comunistas ou simpáticos ao comunismo quanto os artistas nazis.
 
De origem proletária, filho de um ferroviário, nascido em Raudnitz, em 1885, Pabst sempre foi um espírito inquieto: bem jovem foi para Nova Iorque com o objetivo de tornar-se actor de teatro. Em 1914 voltou, atravessando a França, onde foi surpreendido pela eclosão da Primeira Guerra. Foi internado por quatro anos como “cidadão inimigo” num campo de prisioneiros. Libertado, partiu para Berlim, onde se associou, como argumentista ao veterano cineasta Carl Frölich, que mais tarde aderiria ao nazismo.